O martelo das feiticeiras
O manual que caçou bruxas por quatro séculos. O martelo das feiticeiras, ou Malleus maleficarum, foi o mais célebre manual redigido durante o período de "caça às bruxas" da Idade Média. A inflamada epidemia que perseguiu e condenou mulheres, fosse por seus conhecimentos ou comportamentos que fugissem aos padrões morais e religiosos da época, fosse por pura vingança e misoginia, é uma mancha na história da humanidade. Escrito no século XV, o livro beneficiou-se da invenção da imprensa para sua difusão, tendo diversas reedições pelo continente europeu e, apesar de inúmeras polêmicas e dúvidas quanto à validade de seus ensinamentos, chegou aos séculos XVI e XVII com prestígio entre os perseguidores de hereges. Amplamente utilizado pelos tribunais seculares, o manual pode ser responsabilizado pelas mais de 100 mil execuções, em sua maioria de mulheres, realizadas pela Inquisição durante pelo menos quatro séculos, como apontam historiadores. Como identificar bruxas? Como agem bruxas? Como julgar bruxas? Essas são as questões centrais respondidas neste tratado pelos inquisidores Herinrich Kraemer e James Sprenger, que, entre outras afirmações fantasiosas, atribuem à mulher a prática da bruxaria por meio da cópula com o demônio. As bases do pensamento neurótico das práticas misóginas, do controle dos corpos, do sexo e dos conhecimentos médicos articulados com o poder secular e religioso estão aqui demonstradas de maneira sistemática. O livro tornou-se também modelo para persecuções penais modernas, com seu julgamento inquisitório e suas penas baseadas na expiação da carne. O Malleus maleficarum é um documento de importância histórica, filosófica e jurídica. Esta edição revista do texto estabelecido por Rose Marie Muraro, que vem sendo publicado pela Rosa dos Tempos desde 1991, acompanha a magnífica introdução da própria Muraro. De modo brilhante, a Patrona do Feminismo Brasileiro analisa os alicerces presentes no manual, que permitiram a opressão e a violência institucional, por séculos, ao corpo das mulheres. O livro conta também com prefácio do renomado médico psiquiatra e analista junguiano Carlos Amadeu B. Byington. Conforme Muraro afirma em sua introdução sobre O martelo das feiticerias, espera-se que a partir do conhecimento de um passado trágico hoje essa "reinserção do feminino na história, resgatando o prazer, a solidariedade, a não competição, a união com a natureza, talvez seja a única chance que a nossa espécie tenha de continuar viva".