A Ilíada de Homero em decassílabos duplos
A Ilíada de Homero em decassílabos duplos
A Ilíada narra os eventos próximos à queda de Troia. Seu fio condutor, explicitado já no primeiro verso do poema, é a ira de Aquiles. Essa ira devastadora, deflagrada por um desentendimento com o líder do exército grego, Agamêmnon, traz uma miríade de mortos tanto para gregos quanto para troianos, regando a planície de Troia com o sangue de guerreiros. O tempo todo, acompanhamos o conflito pelas lentes magistrais do poeta, que consegue tanto se aproximar do detalhe cirúrgico de uma cena quanto se afastar e nos dar a perspectiva maior do conflito, em especial pelo olhar de Zeus, que a tudo assiste do topo do monte Ida. Talvez o mais fascinante sobre esta história seja a grandeza de seus personagens. Por mais que Aquiles seja o protagonista, há espaço, nos dois lados do conflito, para muitos heróis brilharem com façanhas guerreiras, com duelos singulares e também com discursos ao longo do poema. A todo momento, o texto nos convence de que aquilo que está acontecendo — e de que aquele herói que está em foco — é o que há de mais importante e mais devastadoramente humano que existe. Ainda que atribuídas a Homero, hoje sabemos que a Ilíada e a Odisseia foram desenvolvidas oralmente ao longo de séculos, de forma anônima e coletiva, por diversas gerações de poetas-cantores. Trata-se de uma poesia tradicional, composta em uma linguagem literária que traz em si fósseis linguísticos de diversas épocas diferentes, além de invenções e liberdades que não são comuns a uma fala cotidiana. Nesse sentido, poderíamos dizer que é uma linguagem elevada e solene: é um registro linguístico próprio para se falar de grandes feitos. Entretanto, não é um discurso rocambolesco ou pernóstico: é uma linguagem que podia ser compreendida por todos. Também esta tradução busca apresentar uma Ilíada que possa ser compreendida por todos, clara e fluente. Ao mesmo tempo, ambiciona ombrear-se com o texto grego, valendo-se dos artifícios poéticos canônicos de nossa língua e também emulando algumas das características principais da própria épica grega, como a repetição, tão importante para a composição dessa poesia oral.