Tratado Político
«Aqui jaz Spinoza, cuspam-lhe na campa». Nenhum filósofo foi tão digno. E nenhum tão execrado. Baruch Spinoza (1632-1677), judeu holandês de ascendência portuguesa excomungado e banido da comunidade judaica, o herege, o ímpio, o ateu condenado por todos os credos, é «o Cristo dos filósofos» (Deleuze). Humilde polidor de lentes e filósofo solitário, escreve uma das obras máximas da história da filosofia: uma Ética, publicada a título póstumo, onde, sob a superfície da ordem das razões metafísicas exposta «segundo o método geométrico», corre um rio de fogo libertador, uma crítica prática da nossa servidão voluntária. Todo um culto filosófico das paixões alegres, toda uma ética da alegria, contra as paixões tristes que, afastando-nos do nosso poder, fazem essa servidão. A pulsão prática da filosofia spinozista prolonga-se no Tratado teológico-político (1670), publicado como livro anónimo, e neste inacabado e também póstumo Tratado político, fundamentação ontológica de uma democracia radical, de um Poder afirmativo do «poder da multidão», de uma República de homens livres.