Ler Gramsci para pensar a política e a educação
“É preferível ‘pensar’ sem disto ter consciência crítica, de uma maneira desagregada e ocasional, isto é, ‘participar’ de uma concepção do mundo ‘imposta’ mecanicamente pelo ambiente exterior, ou seja, por um dos muitos grupos sociais nos quais todos estão automaticamente envolvidos desde sua entrada no mundo consciente (e que pode ser a própria aldeia ou a província, pode se originar na paróquia e na ‘atividade intelectual’ do vigário ou do velho patriarca, cuja ‘sabedoria’ dita leis, na mulher que herdou a sabedoria das bruxas ou no pequeno intelectual avinagrado pela própria estupidez e pela impotência para a ação), ou é preferível elaborar a própria concepção do mundo de uma maneira consciente e crítica e, portanto, em ligação com este trabalho do próprio cérebro, escolher a própria esfera de atividade, participar ativamente na produção da história do mundo, ser o guia de si mesmo e não mais aceitar do exterior, passiva e servilmente, a marca da própria personalidade?” (Antonio Gramsci, Cadernos do cárcere, v. 1) Essa pergunta, elaborada por Antonio Gramsci contribui de forma inconteste para explicitar as principais questões sobre as quais nos debruçamos nesta obra,sobretudo após o golpe parlamentar, jurídico e midiático de 2016, que retirou a presidenta Dilma Rousseff do Palácio do Planalto e, em 2018, a eleição de Jair Bolsonaro para governar o país até 2022, com a forte influência da “(não) consciência” formada em tempos de fake news — nos desafia a pensar como esses fatos políticos implicam, desafiam, instigam ou provocam não somente a realidade brasileira, mas a de todo o mundo. Os cenários brasileiro e mundial nos colocam diante de várias questões, sendo uma das mais relevantes, pensar como se constrói uma concepção de mundo, de sociedade e de indivíduo em contextos ultraneoliberais e de retrocessos políticos autoritários. Para dialogar com essa questão, que em certa medida também foi proposta por Gramsci, sobre como se elabora uma concepção de mundo, se im-posta e desagregada, ou consciente e crítica, neste livro apresentamos reflexões a partir de aspectos da política e da educação em contextos internacionais e nacionais. A retomada do pensamento gramsciano, sobretudo a partir dos conceitos de práxis, hegemonia, educação, formação humana, língua, Estado e política, tem por objetivo geral evidenciar a contribuição de Gramsci, ontem e hoje, para o exercício do nosso pensar e agir politicamente A palavra de ordem, como diria Gramsci, é: “pessimismo da inteligência, otimismo da vontade”. A realidade do Brasil revela, primeiramente, o “otimismo da vontade”, por apontar os inúmeros esforços empreendidos para que, por exemplo, a educação para todos e todas ocupas-se a cena da política do país, sobretudo no início deste século XXI. Ainda assim, premidos pelo “pessimismo da inteligência”, precisamos reconhecer que as iniciativas relevantes que se desdobraram em políticas públicas de educação nos últimos quinze anos, da creche à pós-graduação, não foram suficientes para se consolidar em políticas de Estado que sobrevivessem aos diferentes interesses dos governos que se elegeram a cada mandato, ou mesmo que ocuparam o Estado após manobras midiáticas, parlamentares e jurídicas. [Organização] Maria Margarida Machado [Autores] Adriane Guimarães de Siqueira Lemos Cláudia Borges Costa Gaudêncio Frigotto Gianni Fresu Giovanni Semeraro Júlio César Apolinário Maia Maria Ciavatta Maria Emilia de Castro Rodrigues Maria Margarida Machado Marise Ramos Peter Mayo Simone Aparecida de Jesus Vera Lúcia Paganini